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terça-feira, 15 de janeiro de 2013


Álcool e Drogas em Meio Laboral

Algumas considerações sobre a deteção dos consumos


No âmbito do combate às substâncias psicoativas importa, hoje, estender ao mundo do trabalho medidas e intervenções de fundo, sobretudo ao nível da prevenção e educação para a saúde capazes de travar o problema social das dependências. Este é o nosso entendimento.

Não obstante a falta de dados oficiais que permitam conhecer, claramente, a realidade do problema ao nível da população enquadrada profissionalmente, temos ainda outra limitação que reside no facto de, em Portugal, não existir enquadramento jurídico específico desta matéria. Existem, como sabemos, vários diplomas que controlam a posse, o uso e a venda, no entanto, não existe nenhum dispositivo legal dirigido especificamente aos locais de trabalho.

Significa, portanto, que apesar de não existir uma política de prevenção global em meio laboral, existem intervenções avulsas desenvolvidas em algumas organizações tanto públicas como privadas, principalmente ao nível do álcool.

A inexistência de legislação, neste âmbito, é uma matéria que nos preocupa, ainda mais quando consideramos que esse é um forte obstáculo para a implementação dos PAT- Programas de Apoio a Trabalhadores – na medida em que estes programas deveriam estar sujeitos a uma legislação concertada entre sindicatos, empregadores e governo no sentido de serem salvaguardados os direitos de todas as partes envolvidas.

 Ao não existirem normas e procedimentos definidos o que temos, no nosso país, são situações avulsas e descontroladas. Existem empresas que fazem análises aos trabalhadores logo no acto de admissão, outras vão fazendo rastreios periódicos sem uniformização de práticas e critérios. É nossa posição que os testes toxicológicos para determinar o consumo de álcool e drogas no meio laboral envolvem problemas de ordem moral, ética e jurídica e devem ser encarados como uma parte da solução sistemática em que se incluem informação, prevenção, tratamento e a reabilitação.

Neste sentido, os programas de prevenção de álcool e drogas das empresas variam nas suas filosofias, métodos e objetivos. Nalguns deles, encontra-se subjacente um acordo formal entre os trabalhadores e a direcção, tais como políticas disciplinares, orientação das chefias na forma de lidar com os problemas, distribuição e consumo de álcool no local de trabalho, etc.

Algumas empresas optam pela proibição total de álcool, incluindo a sua venda nas instalações, sendo que o não cumprimento desta regra acarreta medidas disciplinares que vão desde advertências a despedimento com justa causa. Outras permitem que se venda apenas em algumas áreas de trabalho por razões de segurança. E muitas não impõem qualquer tipo de proibição.

Esta conjuntura permite-nos, pois, o entendimento as empresas tendem a optar por medidas predominantemente disciplinares como resposta a este problema, relegando para segundo plano a promoção da segurança e da saúde.

Nesta perspetiva, o enquadramento legal e normativo referente às substâncias psicoativas em meio laboral é o que seguidamente se refere:

- A prevenção de riscos profissionais tem sede na Lei 102/2009, de 10 de Setembro que estabelece novo regime jurídico da Segurança e Saúde do Trabalho que estabelece que a prevenção deve assentar numa correta e permanente avaliação de riscos e ser desenvolvida segundo princípios, políticas, normas e programas que visem, nomeadamente a promoção e a vigilância da saúde do trabalhador e o incremento da investigação técnica e científica aplicadas no domínio da segurança e da saúde no trabalho, em particular no que se refere à emergência de novos fatores de risco (Artigo 5º).

- Constitui, ainda, obrigação geral do empregador “assegurar ao trabalhador condições de segurança e de saúde em todos os aspetos do seu trabalho” (Artigo 15º), devendo zelar, de forma continuada e permanente, pelo exercício da atividade em condições de segurança e de saúde para o trabalhador, identificando todos os riscos previsíveis em todas as atividades da organização; deve, ainda atenuar o trabalho monótono e o trabalho repetitivo e reduzir os riscos psicossociais.

- A vigilância da saúde dos trabalhadores é igualmente uma obrigação geral do empregador que, nos termos da Lei 102/2009, de 10 de Setembro, deve ser assegurada em função dos riscos a que o trabalhador estiver potencialmente exposto no local de trabalho, devendo o empregador para o efeito vigiar as condições de trabalho.

- A realização dos exames médicos encontra-se devidamente tipificada na legislação – exame de admissão, exames ocasionais, exames complementares – sendo o seu objetivo “ verificar a aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício da sua profissão, bem como a repercussão do trabalho e das suas condições na saúde do trabalhador” (art. n.º 108.º).

- O Regime Jurídico para a Segurança e Saúde no Trabalho obriga o empregador a consultar por escrito, previamente ou em tempo útil, os representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde ou, na sua falta, os próprios trabalhadores, sobre a avaliação dos riscos para a segurança e a saúde no trabalho (Artigo 18º) - assegura que toda e qualquer intervenção nesta matéria seja desenvolvida respeitando o quadro de informação, consulta e participação dos trabalhadores e seus representantes.

Decorre do disposto, considerarmos ser necessária, fundamental e urgente uma lei específica de enquadramento destas práticas – testes de despistagem de consumos. Temos, continuadamente, nos vários fóruns de discussão destas matérias sublinhado essa necessidade.

Sublinhamos, pois, alguns critérios. Esta Legislação deverá:

1 - Definir as condições em que os testes podem ser realizados, mediante consentimento do interessado;

2 - Definir as profissões/categorias profissionais/sectores de atividade em que os testes são obrigatórios;

3 - Definir os tipos de testes autorizados, considerando requisitos de qualidade técnica e fiabilidade;

4 - Prever a realização de testes confirmativos, em caso de resultado positivo;

5 - Definir que estes testes só podem ser realizados nos serviços de saúde internos da empresa, ou em serviços externos devidamente habilitados, e com a obrigação de sigilo profissional de todos os profissionais envolvidos nesse ato;

6 - Garantir a confidencialidade das informações obtidas, designadamente que os resultados dos testes só serão comunicados ao médico do trabalho responsável ou médico assistente do trabalhador;

7 - Garantir a manutenção do posto de trabalho do trabalhador enquanto este se encontrar em tratamento, ou a sua transferência para outras funções em que não haja risco de constituir perigo para terceiros;

8 - Garantir que o resultado positivo só influenciará a decisão de admissão de um candidato quando estiverem em causa interesses de igual valor e nunca constituirá fundamento de discriminação arbitrária;

Dentro destes condicionalismos legais será, pois, legitimo que a entidade patronal estabeleça procedimentos internos com vista à resolução de problemas de consumo de substâncias psicoativas. É nossa posição que ainda que se considere justificada a realização de testes de despistagem obrigatórios a determinadas categorias de trabalhadores e em determinadas situações, nomeadamente quando se encontrem em causa a saúde e a segurança públicas, terá de ser a lei a impor tal obrigação, salvaguardando devidamente todos os direitos, liberdades e garantias.

Estes procedimentos devem, pois, ser parte integrante do sistema de gestão da segurança e saúde no trabalho e incluídos nos objetivos de promoção da saúde, não podendo traduzir-se em intervenções arbitrárias e desregradas das entidades patronais, mas orientar-se por princípios radicados no respeito pela liberdade e dignidade da pessoa humana.

 

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