No passado dia 14 de outubro de 2020, a Comissão Europeia publicou a sua Estratégia Química
para a Sustentabilidade, uma das pedras angulares do Green Deal Europeu. O seu
objetivo é impulsionar a inovação para produtos químicos seguros e sustentáveis
e aumentar a proteção da saúde humana e do ambiente contra produtos químicos
perigosos.
Perguntámos
a Tony Musu, investigador da ETUI e perito em riscos químicos, a sua avaliação
desta nova estratégia. Na sua opinião, os dois principais vencedores são os
consumidores e o ambiente, enquanto os trabalhadores são os grandes perdedores.
Porque
é que era necessária uma nova estratégia europeia para as substâncias químicas?
Os
muitos produtos químicos a que estamos expostos no dia-a-dia têm o potencial de
impactar o ambiente e a saúde humana, incluindo a saúde das gerações futuras.
Um número crescente de estudos científicos está a destacar o aumento de
substâncias químicas perigosas no sangue e no tecido dos seres humanos,
incluindo certos pesticidas, biocidas, produtos farmacêuticos, metais pesados,
plastificantes e retardadores de chama.
Esta
poluição química é a causa de muitas doenças, incluindo certas formas de
cancro, distúrbios respiratórios e distúrbios do sistema de reprodução e/ou
cardiovascular. Está também a contribuir para a perda de biodiversidade
testemunhada nos últimos anos.
A
última visão a longo prazo da UE sobre os produtos químicos remonta ao Livro
Branco adotado há vinte anos, que deu origem aos regulamentos REACH e CLP que
regem a comercialização de substâncias químicas na Europa. Chegou, assim, o
momento de definir um novo rumo, apostando em alcançar zero poluição.
Quais
são, na sua opinião, os pontos-chave da estratégia?
Os
consumidores e o ambiente são, sem dúvida, os grandes vencedores, com a
estratégia a prever, por exemplo, progressos na proibição das substâncias mais
tóxicas em produtos de consumo, como embalagens de alimentos, brinquedos,
produtos de puericultura, cosméticos, detergentes e têxteis.
As
substâncias em causa são cancerígenas, mutagénicos e substâncias reprotóxicas
(CMR), desreguladores endócrines, substâncias persistentes, bioacuculativas e
tóxicas (PBT) e substâncias muito persistentes e muito bioacusulantes (vPvB),
bem como as que afetam os sistemas imunitário, neurológico ou respiratório.
A
utilização de substâncias per e polifluoroalquilídeas (PFAS), encontradas
principalmente em revestimentos anti-aderentes e não biodegradáveis, também
será eliminada gradualmente, a menos que se prove que é essencial para a
sociedade. Através da introdução de um "fator de avaliação da
mistura" no REACH, as exposições combinadas são finalmente tidas em conta
nas avaliações de risco químico. Serão incluídas novas classes de perigo no
Regulamento CLP (Classificação e Rotulagem) para os desreguladores endócrinsos,
os ptus, os vPvBs e as substâncias persistentes e móveis para melhor as abordar
na legislação europeia.
Olhando
para o outro lado da moeda, foi prometido aos fabricantes que cada nova medida
proposta pela Comissão Europeia no âmbito desta estratégia será sujeita a uma
avaliação de impacto socioeconómico. Prevê-se que se limitem os progressos na
proteção da saúde humana e do ambiente que possam dificultar o comércio de
produtos químicos. Receberão igualmente financiamento para impulsionar o
investimento e a inovação na produção e utilização de produtos químicos seguros
e sustentáveis por design.
Que
progressos foram feitos na proteção dos trabalhadores contra os riscos
químicos?
Infelizmente,
parece que os trabalhadores expostos a produtos químicos perigosos são os
grandes perdedores. Não foram anunciadas medidas concretas para reforçar a sua
proteção, para além da atualização dos valores-limite de exposição profissional
existentes para os derivados do amianto e dos chumbos, bem como da adoção de um
novo valor-limite vinculativo para os di-isocianatos (produtos químicos
alergénicos).
E
mesmo isso não era novidade, uma vez que todas estas medidas tinham sido
anunciadas antes da publicação da estratégia. A Comissão Europeia limitou-se a
anunciar que, no contexto da futura Estratégia Europeia de Segurança e Saúde no
Trabalho, prevista para 2021, pretende identificar os produtos químicos mais
perigosos para os quais serão necessários valores-limite de exposição
profissional.
Que
novas medidas seriam necessárias para melhorar a proteção dos trabalhadores?
Mais
de 100.000 pessoas na UE morrem anualmente de cancros relacionados com o
trabalho, enquanto cerca de 50% das doenças reconhecidas relacionadas com o
trabalho estão ligadas à exposição no local de trabalho a produtos químicos
perigosos.
Gostaríamos
de ter visto a estratégia que definia objetivos concretos, como os que foram
conjuntamente solicitados pela Confederação Europeia dos Sindicatos (ETUC),
pela Organização Europeia dos Consumidores (BEUC) e pelo Gabinete Europeu do
Ambiente (EEB), por exemplo, a adoção de OELs vinculativos para vinte e cinco
agentes de importância prioritária até 2024 ou o alargamento imediato do âmbito
da Diretiva Cancerígena e Mutagens (CMD) às substâncias reprotóxicas.
Outra
medida concreta seria a inclusão de medicamentos perigosos no anexo I da CMD,
proporcionando assim uma melhor proteção aos doze milhões de trabalhadores do
sector da saúde expostos a estes produtos químicos na administração de cuidados
aos doentes.
A
longo prazo, a Comissão Europeia poderia igualmente propor a fusão do DCM com a
Diretiva relativa aos agentes químicos (CAD), abordando melhor as exposições
profissionais a substâncias para as quais não pode ser definido um limite de
exposição sem efeitos nocivos, tais como desreguladores endócritas ou sensores
de pele e/ou respiratórios.
Uma
vez que está em curso uma revisão do CMD, não seria uma boa oportunidade para reafirmar
estas exigências?
Naturalmente.
A Federação Europeia dos Sindicatos dos Serviços Públicos (EPSU), a
Confederação Europeia dos Sindicatos (ETUC) e outras organizações parceiras
acabam de lançar uma campanha chamada "Stop cancer at work" destinada
a levar o Comissário Europeu Nicolas Schmit a tomar medidas para travar o
cancro no trabalho. O objetivo é conseguir que o maior número possível de
cidadãos europeus assine, a fim de que a Europa tome as medidas de prevenção
necessárias para pôr termo a estas evitáveis doenças profissionais.
Nota:
Tradução da responsabilidade do Departamento de SST da UGT
Aceda
à versão original Aqui.
0 comentários:
Enviar um comentário